segunda-feira, 11 de maio de 2009

Menino Francisco


Menino Francisco rabiscou uma flor no papel.
_Que é isso menino, flor marrom com folhas azuis?
E a mãe, hábil manipuladora de borrachas apagou o desenho de Francisco e ensinou-lhe o que lhe parecia óbvio:
_Menino tolo, não sabe que flores são vermelhas com folhas verdes?
Menino Francisco aprendeu logo a lição. Passava os dias que lhe escorriam lentos, a desenhar flores vermelhas com folhas verdes. Muitas delas...
Menino Francisco cresceu. Arrumou emprego numa fotocopiadora. Acostumou-se logo a aceitar a rotina das pilhas de papéis à sua frente, cumprimentar os clientes que não raras vezes também eram as mesmas caras, apertar o botão e cobrar alguns centavos pelo trabalho.
Nas horas vagas o moço Francisco dedicava-se à seu passatempo preferido. Pintar telas... Flores vermelhas com folhas verdes.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

A indiazinha


E a velha adentrou ao recinto puxando pela mão a menina. Olhos pretos e espertos, mirou-me de canto ameaçando um sorriso acanhado.
_É uma indiazinha, coitadinha! Está a vender colares!
_Dá um abraço no tio!
_Olha que lindos!
O tio enfia as mãos no bolso e estende uma nota amassada, enquanto a velha cata algumas sobras do almoço imaginando que pelo avançado da hora, deva estar com fome.
A pequena de olhos pretos sorri. Sorrio também enquanto observo-a. Enquanto come, os olhos procuram por algo que não sei o que é. Ela balança os pés, calçados com um chinelo bem maior que eles. Parece uma senhorinha. Saia comprida, a blusa rota e um colar pendurado ao pescoço, como os que traz no balaio de fibras, abraçado à cintura.
_Ah coitadinha! Estava com fome.
A velha parece querer redimir-se pelos quinhentos anos de exploração. Toma o balaio que a menina mantem ao lado da cadeira e vai oferecendo aos que estão por ali, enquanto repete:
_É uma indiazinha!
De repente a pequena recolhe as sobras em uma sacola e sai em silêncio em direção à porta. Apenas um levantar de olhos e novamente o mesmo sorrisinho ligeiro.
Do lado de fora, sentada à sombra está a mãe amamentando o filho de colo.
A velha alcança a menina, segurando-a pelo ombro e apontando para a igreja há alguns metros de distância:
_Ta vendo aquela imagem? É a padroeira de vocês. Diz pra mãe rezar pra ela.
Nem matas, nem ocas, nem pajé, nem nada do que os livros grossos ou os professores contaram. O relógio apontava quatro horas da tarde e na terceira badalada do sino mãe e filha índias adentravam a igreja. Lá dentro um hino à padroeira.